Outro daqueles artigos antigos que precisam ser revistos, pois são cada dia mais atuais.
Então
me pego pensando: como é que sujeitos em papel de liderança nas
empresas, tão inteligentes, conseguem tomar decisões idiotas em nome de
uma estratégia? Tá na cara que vai dar confusão, que vai dar errado, mas
os cabecinhas decidem que assim será.
Pois saiba que já fiz
parte, na verdade faço, de tomadas de decisão das quais depois me
envergonho. Compactuei com a burrice e assinei embaixo, algumas vezes
sendo contra, mas perdendo para a maioria, para o consenso. Outras
vezes, por “deixar pra lá”. E outras, conscientemente, fazendo parte da
burrada. O interessante – ou assustador – é que essas pessoas, eu
inclusive, no momento da tomada da decisão, estavam usando a
inteligência. Pensaram, elaboraram, criticaram, analisaram e... Agiram
como asnos.
Chamo esse fenômeno de asinidade estratégica. Poderia
ser “asnidade”, mas “asinidade” soa melhor. E se você não sacou, o
termo vem de asno mesmo.
Dê uma olhada nas decisões que você
toma, e você perceberá que muitas delas são dignas de um asno
estratégico. O asno estratégico não faz nem deixa fazer, e é capaz de
discorrer por horas sobre a correção de seu ponto de vista, revestindo
seu discurso com argumentações consistentes, calcadas na “prudência”,
“ética”, “interesses dos acionistas”, “imagem”, “padrões” e outros
jargões do mundo dos negócios que povoam o universo do asinino
estratégico. A asinidade estratégica vive do curto prazo, das decisões
imediatas que vão representar um risco gigantesco para quem vier lá na
frente, seja outro gerente, outro político ou a próxima geração. Na
asinidade estratégica pensamos que estamos cortando gordura enquanto
cortamos os músculos necessários para o crescimento. A asinidade
estratégica floresce principalmente no consenso, na tentativa de agradar
a maioria, preocupada em manter-se nas áreas de conforto. Nasce também
no jogo político de minorias interessadas exclusivamente em manter suas
posições de poder. Mas há um momento especial em que a asinidade
estratégica surge com todo esplendor: é quando a percepção do risco nas
escolhas acorda os deuses do cagaço e da ignorância. E dá-lhe asno
estratégico...
Aliás, quantos asnos estratégicos você conhece?
A
vacina contra a asinidade estratégica é a ação individual, quando
alguém tem a luz, percebe a iminência do desastre, chama a atenção e
luta com todas as forças para mudar as decisões. Mas esse alguém tem que
ter repertório, conhecimento, preparo. Tem que se fazer respeitar. Tem
que ter... culhões.
Culhões? Na República do Cagaço? Pois é...
É
fácil? Claro que não. Quando eu tinha meus vinte, trinta anos,
esbanjava energia suficiente para brigar o tempo todo contra a asinidade
dominante, mesmo perdendo em 99% das vezes. Hoje, passando dos
cinqüenta, não tenho mais saco. Fiquei ranheta, impaciente,
insuportável. Teimoso como um... Asno!
Odeio a asinidade
estratégica. Por causa dela me sinto burro. Mas felizmente sou um asno
consciente. E é essa consciência que me dá esperanças de um dia,
lucidamente, desasnar.
Escrito por Luciano Pires
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